Vista do Sul

O Brasil provavelmente continuará sendo o país líder no mercado global de defensivos agrícolas, afirma Alessandra Lancellotti, analista de produtos químicos da Frost & Sullivan, sediada em São Paulo, que prevê um crescimento anual composto (CAGR) de 4,81 TP3T até 2016. "O potencial de crescimento para a agricultura é enorme, considerando a disponibilidade de terras aráveis, já que as culturas permanentes ocupam apenas 81 TP3T da área brasileira", afirma Lancellotti. Ela apresentou à Farm Chemicals International sua visão sobre as perspectivas para os agroquímicos no Brasil e na Argentina.
FCI: Você pode falar um pouco sobre as tendências que você está observando no setor de proteção de cultivos no Brasil?
O mercado de defensivos agrícolas no Brasil é altamente voltado para soluções personalizadas e econômicas, e essas características devem ser consideradas pelas empresas para competir efetivamente no mercado de produtos químicos. É importante que os participantes do mercado se concentrem em produtos e aplicações rentáveis. Produtos mais seletivos, capazes de atuar sobre pragas específicas e com impacto ambiental reduzido, serão preferidos.
Estimativas do Sindicato Nacional da Indústria de Defensivos Agrícolas (SINDAG) indicam que o Brasil utiliza cerca de 4 kg de defensivos agrícolas ativos por hectare, enquanto na França e no Japão esse volume gira em torno de 10 kg por hectare. Isso indica que há espaço para aumentar a produtividade no Brasil, e investimentos em aprimoramento tecnológico devem ser feitos pelas empresas líderes.
Até 2015, a produção brasileira de culturas como soja, trigo, arroz, milho e feijão deverá aumentar em pelo menos 20 milhões de toneladas. A área cultivada com essas culturas deverá aumentar em 10 milhões de hectares no mesmo período.
Nos últimos anos, também houve um aumento nas campanhas de marketing no setor. Esforços para diferenciar produtos e criar marcas tornaram-se mais populares, e algumas empresas buscaram definir sua "personalidade" em um mercado cada vez mais competitivo que vende produtos comoditizados e homogêneos.
FCI: Regionalmente, onde estão as maiores oportunidades para herbicidas, inseticidas e fungicidas fora de patente?
Os herbicidas representam 64% em faturamento no segmento de defensivos agrícolas no Brasil e devem continuar crescendo devido à alta aplicabilidade em culturas como soja e milho.
Além disso, os herbicidas são adequados para monoculturas e uso intensivo da terra, amplamente encontrados no Brasil. Espera-se que cresçam um pouco mais em comparação com inseticidas, fungicidas e outros. Os inseticidas, no entanto, recebem os maiores investimentos em inovação de produtos.
No Brasil, os defensivos agrícolas patenteados respondem por 301 TP3T do volume de mercado, enquanto os produtos genéricos respondem por 701 TP3T. Os produtos patenteados respondem por 401 TP3T da receita de mercado, enquanto os produtos genéricos respondem pelos 601 TP3T restantes.
Os herbicidas também dominam o setor na Argentina, com 67% de participação de mercado em 2010. Os inseticidas formam o segundo maior segmento, com 18%, os fungicidas, com 12%, e outros produtos, 3%.
O glifosato representa 641 TP3T da receita do segmento de herbicidas na Argentina. Produtos premium representam aproximadamente 401 TP3T do mercado total de glifosato.
Na Argentina, com o avanço da tecnologia, a demanda por produtos premium, como formulações específicas de glifosato, deve continuar a crescer. Ao mesmo tempo, o uso de produtos genéricos persistirá. Portanto, é importante que as empresas apresentem aos clientes ambas as opções para atender aos diferentes tipos de necessidades do mercado.
Se os preços dos genéricos não aumentarem num futuro próximo, especialmente no caso do glifosato, cujo preço depende do mercado chinês, muitas empresas deverão abandonar o mercado de proteção de cultivos devido às baixas margens e à alta concorrência.
FCI: Quão difícil é registrar um produto hoje no Brasil?
O processo de registro de agrotóxicos é bastante burocrático no Brasil. Os fabricantes precisam estar preparados para uma série de testes técnicos e apresentar documentos aos órgãos reguladores para comprovar a eficácia de seus produtos e garantir que eles não agridam o meio ambiente e a saúde humana.
Nesta fase, a empresa encontra-se em um período denominado Registro Especial Temporário (RTE). A documentação e as informações técnicas são analisadas pelo Ministério da Agricultura, pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) e pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (IBAMA), além de serem auditadas por organizações privadas. Somente após receber a aprovação de todas as entidades, os fabricantes podem comercializar seus produtos.
Devido à falta de uniformidade entre as organizações envolvidas, o processo completo de registro, desde a fase de P&D até a comercialização, pode levar, em média, 10 anos. Se não houver mudanças estruturais no processo, espera-se que o impacto seja alto a médio e longo prazo, durante o período previsto até 2016.
A ANVISA possui cerca de 2.200 defensivos agrícolas registrados.
FCI: Em que direção você acha que as políticas governamentais estão sendo tomadas que podem restringir ou estimular o crescimento de produtos químicos para proteção de cultivos?
A falta de crédito em 2008/09 foi um dos fatores para o declínio da receita total do mercado brasileiro de agroquímicos durante a crise econômica.
O Brasil tem um número significativo de pequenos e médios agricultores, para os quais o apoio creditício e os subsídios governamentais são fundamentais para a sustentabilidade do negócio.
Desde o início de 2010, os bancos estavam mais dispostos a conceder crédito ao setor agrícola, e atualmente o governo está desenvolvendo alguns programas para facilitar o crescimento do setor.
Os impostos locais brasileiros são elevados em comparação com outros países. Por exemplo, os agroquímicos vendidos entre estados estão sujeitos a um imposto, Impostos Sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços (ICMS) – um imposto que não existe em outros países.
FCI: Quais são os principais aspectos que as empresas químicas que buscam entrar nesses mercados devem observar?
1.) O mercado brasileiro de defensivos agrícolas apresenta elevadas barreiras de entrada, como altos gastos em P&D e licenciamento de produtos (patentes). Além disso, os novos entrantes devem ter condições de investir fortemente na cadeia de distribuição e fornecer suporte técnico especializado, o que exige pessoal treinado e um laboratório de controle de qualidade. Essas barreiras de entrada explicam, em parte, a tendência de consolidação do mercado de defensivos agrícolas no Brasil; as empresas precisam ter escala e ser robustas para investir e crescer.
2.) A introdução de culturas geneticamente modificadas vem mudando a dinâmica do mercado, exigindo novos tipos de herbicidas e pesticidas. As empresas do setor de fornecimento e distribuição devem garantir que suas linhas de produtos sejam atualizadas de acordo com as necessidades do usuário final e as novas tecnologias.
3.) Níveis de inflação e aumento dos custos operacionais: Estima-se que, segundo estimativas privadas, o impacto da inflação na estrutura de custos dos processos de produção e comercialização seja de cerca de 25% por ano. A forma como ela afeta os custos, especialmente mão de obra e transporte, dificulta o planejamento para os produtores agrícolas. Somados às recentes variações cambiais e ao fato de o mercado de defensivos agrícolas ser comoditizado e, consequentemente, medido em dólares, os cenários de preços são desequilibrados. Assim, em muitos casos, os produtores agrícolas tornam-se clientes de oportunidade, aguardando até o último momento possível para efetivar as compras.
4.) Crescimento das importações chinesas: Os produtos chineses entram no mercado de defensivos agrícolas com qualidade e preços inferiores, sendo extremamente difíceis de competir no cenário atual de mercado, já que o custo é a variável de decisão. Algumas empresas chinesas assumiram o controle de empresas locais e esmagadoras de grãos e estão começando a vender seus produtos por meio de suas próprias redes comerciais.